quarta-feira, julho 07, 2004

Ainda com meio país de bandeirinha à janela, tentando perceber como se elimina a Espanha, a Inglaterra e a Holanda e não se consegue fazer o mesmo à Grécia, importa resgatar aquela que, até ver, se assume como a única glória da selecção nacional. Já aqui referida num post que aconselhamos aos nossos leitores (procurem bem que fica já aí nos arquivos) a Skydome Cup, jogada no Canadá em 1995 continua a deter o lugar mais importante na vitrine de troféus da FPF, como o único troféu jamais conquistado oficialmente pela Selecção Nacional Sénior. Importante aqui, aparte todas as razões invocadas aquando da nossa primeira referência ao evento, é contrariar a euforia reinante com um pouco de racionalidade. O facto de Luís Filipe Scolari ser um técnico da mesma fornada do mítico belenense Abel Braga ou condiscípulo de Marinho Peres, não o impermeabiliza de críticas. E essas, convém dizê-lo agora que o prudente silêncio a que nos reservámos enquanto o mundo girava em torno das quinas e dos pagodes finalmente terminou, essas críticas só podem referir-se ao conjunto de critérios utilizados pela equipa técnica da FPF para designar o lote de eleitos para este Neuro'2004. Dizem os escritos mitológicos gregos que a derrota agracia os que ostracizam o passado e a história (é questão de conferir as declarações desse deus grego Machairidis aquando da sua segregação lampiã). Não olhar para a história é, sob o ébrio da glória anunciada, escolher ignorar que o único troféu conquistado pelos séniores da FPF obedeceu a dois pilares primordiais. O primeiro é a raiva primitiva que só uma besta ferida no orgulho pode ostentar. Em futebol, como é do conhecimento geral, essa raiva tem uma única mãe: a derrota. Portugal, esquecendo Electra e os escribas clássicos, não deu conta, neste Neuropeu, que já não perdia nada há pelo menos dois anos. Em 95, a hecatombe de San Siro, na qualificação falhada para o Mundial'94, quase forçou a catarse canadiana. O segundo grande pilar é o princípio de jogarem os jogadores que estão em melhor forma no momento da convocação. Em melhor forma na Liga Portuguesa, entenda-se, sendo este conjunto complementado por uns quantos foras de série estrangeirados. Nacionalismo bacoco? Patriotismo neo-fascista? Nada disso. Puro entrosamento futebolístico, conhecimento empírico da realidade futebolística que dá à equipa representante o quinhão maior de jogadores, motivação e oportunidades a quem nunca as teve e, sendo isto o mais importante, preparar o dinâmico futebol português para continuar a produzir jogadores de craveira eliminando o fosso que separa os clubes de bairro dos grandes europeus, sem que os jogadores tenham que o saltar com as suas próprias pernas (como disso constitui exemplo a ascensão de Costinha). Em Toronto, jogaram aqueles que ao longo da época (ainda a meio, na altura) tinham evidenciado o maior número de argumentos. Claro que essa mudança no azimute foi publicamente justificada com o cansaço das grandes vedetas, treinador incluído, tinham afinal dados apenas tristeza e promessas falhadas ao povo português. Dizemos treinador incluído porque Queiroz foi substituído por um treinador à época sem curriculum nem palmarés, António "se eu soubesse que morria amanhã, agarrava numa metralhadora e fodia meia dúzia de gajos" Oliveira, que depois fez o que se viu em Toronto e mais tarde. Neste campeonato, esta linha não foi respeitada. Se é verdade que tínhamos Cristiano Ronaldo com convocatória justificada pelas maravilhas que fizera outrora no Sporting e sobretudo pela sua cruzada de vendetta pessoal do fado de Bambo, ou Hélder Postiga, do Tottenham desde pequenino segundo palavras do próprio, mostrando nos penaltis contra Inglaterra que soube assimilar a experiência de jogar no quinto clube de Londres e transformá-la em força de vencer, urge reclamar ao treinador que um dia agrediu a murro um pupilo palmeirista (perante o desconsolo dos olhos, já de si trocados, de Amaral) que reveja não só as cassetes da experiência canadiana como as de campanhas de equipas como Nacional ou o Rio Ave esta época nos relvados portugueses. É aí que nascem os grandes jogadores (aí e no Corinthians Alagoano). A Caderneta da Bola lamenta, uma vez mais, vestir, aos olhos de muitos, a pele de Velho do Restelo (quando o histórico belenenses curiosamente, pautou mais a sua história por mostrar ao mundo craques de além mar mais do que de aquém mar) e vir pôr o dedo na ferida que mais importa sarar, agora que todos digerimos o amargo fel que nos ficou da ceia grega. Aliás, se se derem ao trabalho de observar a selecção grega e o manual do professor José Mourinho, rapidamente chegam à conclusão que estas nossas ilações não são nada de novo para Oito Rehagels.

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