sexta-feira, julho 09, 2004

Aproveitando para agradecer a Ivan, o autor do blogue A Praia pelo manifesto exagero elogioso da obra que estes vossos narradores e a bola lusitana se encarregam de manter de pé, a Caderneta da Bola não pode deixar de aproveitar, pela última vez, o rescaldo do Euro para prestar mais uma singela homenagem a esse colosso do futebol português que colocou o União Futebol Clube "Os Pastilhas" no roteiro das grandes colectividades desportivas da Europa Comunitária. "Os Pastilhas", bastião dos irredutíveis ultras das Escadinhas da Barroca, altar mor dessa capital da bola que é a Cova da Piedade, nasceram a 5 de Março de 1972 como uma equipa de futebol patrocinada pelas Pastilhas Rennie, patrocinador que acabou por dar o nome à equipa e também curar a azia dos tiffosi da margem sul depois dos sangrentos confrontos com o Almada. Foi aí que despontou para o futebol esse nome maior do que a história, aí honrou as cores vermelho e brancas do clube que durante anos a fio reinou nas Seixalíadas e, numa rara demonstração de ecletismo, chegou a disputar o Campeonato da Europa de Subbuteo em Barcelona. Um jogador de dimensões siderais, fisicamente fortíssimo, tecnicamente deslumbrante, dono e senhor de um trato aristocrático do esférico e de uma carácter que lhe valeram, como é do conhecimento público, uma transferência para o Sporting Clube de Portugal, onde despontou na equipa junior e confirmou uma estrondosa carreira nos séniores, embora não por muito tempo, como é do conhecimento público. Agora que o seu nome começa, arriscamos, a entrar no perigoso limbo da controvérsia e da mundanidade extra-futebol que germina daninho em torno das estrelas maiores, a Caderneta da Bola eleva a voz e diz bem alto: Joaquim Mota Pinto, histórico coimbrão Mota, que tanta luz trouxeste ao Vitória do Sado, à tua Académica, ao Vasco da Gama de Sines e ao Amora, tu que soubeste pisar o relvado da Medideira como o de Alvalade, com a mesma classe, a mesma segurança defensiva, a mesma certeza no desarme, um solene e titularíssimo obrigado por tudo.

quarta-feira, julho 07, 2004

Ainda com meio país de bandeirinha à janela, tentando perceber como se elimina a Espanha, a Inglaterra e a Holanda e não se consegue fazer o mesmo à Grécia, importa resgatar aquela que, até ver, se assume como a única glória da selecção nacional. Já aqui referida num post que aconselhamos aos nossos leitores (procurem bem que fica já aí nos arquivos) a Skydome Cup, jogada no Canadá em 1995 continua a deter o lugar mais importante na vitrine de troféus da FPF, como o único troféu jamais conquistado oficialmente pela Selecção Nacional Sénior. Importante aqui, aparte todas as razões invocadas aquando da nossa primeira referência ao evento, é contrariar a euforia reinante com um pouco de racionalidade. O facto de Luís Filipe Scolari ser um técnico da mesma fornada do mítico belenense Abel Braga ou condiscípulo de Marinho Peres, não o impermeabiliza de críticas. E essas, convém dizê-lo agora que o prudente silêncio a que nos reservámos enquanto o mundo girava em torno das quinas e dos pagodes finalmente terminou, essas críticas só podem referir-se ao conjunto de critérios utilizados pela equipa técnica da FPF para designar o lote de eleitos para este Neuro'2004. Dizem os escritos mitológicos gregos que a derrota agracia os que ostracizam o passado e a história (é questão de conferir as declarações desse deus grego Machairidis aquando da sua segregação lampiã). Não olhar para a história é, sob o ébrio da glória anunciada, escolher ignorar que o único troféu conquistado pelos séniores da FPF obedeceu a dois pilares primordiais. O primeiro é a raiva primitiva que só uma besta ferida no orgulho pode ostentar. Em futebol, como é do conhecimento geral, essa raiva tem uma única mãe: a derrota. Portugal, esquecendo Electra e os escribas clássicos, não deu conta, neste Neuropeu, que já não perdia nada há pelo menos dois anos. Em 95, a hecatombe de San Siro, na qualificação falhada para o Mundial'94, quase forçou a catarse canadiana. O segundo grande pilar é o princípio de jogarem os jogadores que estão em melhor forma no momento da convocação. Em melhor forma na Liga Portuguesa, entenda-se, sendo este conjunto complementado por uns quantos foras de série estrangeirados. Nacionalismo bacoco? Patriotismo neo-fascista? Nada disso. Puro entrosamento futebolístico, conhecimento empírico da realidade futebolística que dá à equipa representante o quinhão maior de jogadores, motivação e oportunidades a quem nunca as teve e, sendo isto o mais importante, preparar o dinâmico futebol português para continuar a produzir jogadores de craveira eliminando o fosso que separa os clubes de bairro dos grandes europeus, sem que os jogadores tenham que o saltar com as suas próprias pernas (como disso constitui exemplo a ascensão de Costinha). Em Toronto, jogaram aqueles que ao longo da época (ainda a meio, na altura) tinham evidenciado o maior número de argumentos. Claro que essa mudança no azimute foi publicamente justificada com o cansaço das grandes vedetas, treinador incluído, tinham afinal dados apenas tristeza e promessas falhadas ao povo português. Dizemos treinador incluído porque Queiroz foi substituído por um treinador à época sem curriculum nem palmarés, António "se eu soubesse que morria amanhã, agarrava numa metralhadora e fodia meia dúzia de gajos" Oliveira, que depois fez o que se viu em Toronto e mais tarde. Neste campeonato, esta linha não foi respeitada. Se é verdade que tínhamos Cristiano Ronaldo com convocatória justificada pelas maravilhas que fizera outrora no Sporting e sobretudo pela sua cruzada de vendetta pessoal do fado de Bambo, ou Hélder Postiga, do Tottenham desde pequenino segundo palavras do próprio, mostrando nos penaltis contra Inglaterra que soube assimilar a experiência de jogar no quinto clube de Londres e transformá-la em força de vencer, urge reclamar ao treinador que um dia agrediu a murro um pupilo palmeirista (perante o desconsolo dos olhos, já de si trocados, de Amaral) que reveja não só as cassetes da experiência canadiana como as de campanhas de equipas como Nacional ou o Rio Ave esta época nos relvados portugueses. É aí que nascem os grandes jogadores (aí e no Corinthians Alagoano). A Caderneta da Bola lamenta, uma vez mais, vestir, aos olhos de muitos, a pele de Velho do Restelo (quando o histórico belenenses curiosamente, pautou mais a sua história por mostrar ao mundo craques de além mar mais do que de aquém mar) e vir pôr o dedo na ferida que mais importa sarar, agora que todos digerimos o amargo fel que nos ficou da ceia grega. Aliás, se se derem ao trabalho de observar a selecção grega e o manual do professor José Mourinho, rapidamente chegam à conclusão que estas nossas ilações não são nada de novo para Oito Rehagels.